GPLv3 em Barcelona

Depois de organizar a 2a. Conferência Internacional sobre a GPLV3, que aconteceu no Brasil e eu não assisti nenhum sessão, porque como sempre, quem trabalha não se diverte, na última quinta e sexta-feira participei da 3a. Conferência Internacional sobre a GPLv3, desta vez como palestrante.

Eu assisti a palestra do Stallman e como sempre, ele deu show. Tirou todas as minhas dúvidas com relação ao processo de licença, e falou das mudanças que estão sendo feitas, uma por uma, detalhadamente. Então eu decidi escrever umas linhas para que as pessoas ficassem sabendo do que está sendo feito, e talvez entendam um pouco melhor o motivo por trás das mudanças propostas.

1) Tivoizacão: mecanismos como o existente no produto Tivo, que permite que o usuário grave diversos canais de TV de uma só vez para assistir depois, mas não permite que você assista fora do Tivo. O Tivo inclui diversos softwares GPL, e como a licença diz, você poderia modificar para remover a disfunção de não permitir que você somente assistisse os programas que você gravou usando o Tivo. Mas você não pode porque o Tivo inclui mecanismos de verificação do binário que faz com que ele não rode binários modificados, que na prática, faz com que a liberdade de modificar o Software Livre para que ele se adapte suas necessidades não se realize na prática.

2) DRM, ou como Stallman define: a funcionalidade de se recusar a funcionar. A GPLv3 não tornará DRM impossível, mas fará com que as pessoas que decidam a implementar forneçam o código fonte para que as pessoas tenham a opção de não se sujeitar a esta recusa de função. A liberdade número zero diz que você tem a liberdade de usar o software para qualquer finalidade. Mas você não pode usar esta liberdade para restringir ela dos outros usuários.

3) Patentes de Software: patentes de software criam monopólios de idéias. Quando um método de como gerar arquivos texto usando um programa de computador é patenteado, e você sem nem saber que esta patente existe escreve um programa que use aquele método, você está violando a patente e por isso pode ser processado por alguém que você jamais viu ou conheceu. A diferença entre violação de Copyright e de patente é que o Copyright holder só poderia processar a pessoa que cometeu a violação da licelicença, mas não todos os usuários. A legislação das patentes permite que o detentor do monopólio processe todos os usuários "ilegais" do método, ou seja, todos os usuários do software. A GPLv3 trata isso, na mesma forma que outras licenças de Software Livre já tratavam no passado, a pessoa que distribui o software é responsável pelas licenças de patentes que podem estar sendo implementadas no software em questão, isto é, se viola patente, o problema é de quem implementou, e não de quem está usando, e protege os usuários da ameaça das patentes.

4) Compatibilidade com outras licenças - algumas licenças permitem que o software seja relicenciado sob outras licenças A GPLv3 vai explicar melhor este processo e trabalhar com um FAQ onde estaria uma lista de licenças compatíveis.

5) GPLv3 será modular. Ela permitirá que você inclua algumas cláusulas adicionais, que por algum motivos foram deixadas de fora da licença Você pode escolher, por exemplo, que seu código, quando rodando em servidores de acesso público, deve ser oferecido aos seus usuários, mas você não é obrigado a fazer isso. Se eu entendi direito o que o Stallman falou, quem gera versões alteradas do software pode escolher retirar as permissões adicionais, e o Oliva me falou que restrições adicionais, como essa dos webservers não poderia ser retirada.

6) LGPL será a GPL com um anexo, seguindo o que eu expliquei no ponto 5.

7) Terminar a licença - Quando alguém violava a GPLv2, a licença era automaticamente terminada. Isso gera um problema prático gigante para pessoas que não sabiam que estavam violando, e querem consertar o erro, porque elas têm que pedir autorização explícita para todos os detentores de direito daquele software, que, em alguns casos pode ser centenas ou milhares. A GPLv3 vai tratar isso da seguinte forma: o desenvolvedor que perceber a violação vai notificar o violador de que ele (ou ela) tem 60 dias para corrigir o erro, caso contrário a licença é terminada. O prazo começa a contar do momento da notificação, e somente terminam a licença os desenvolvedores que tiverem oficialmente dado o prazo de 60 dias para consertar o problema.

8) Não é um contrato - este título será modificado no segundo draft, segundo Eben Moglen.

9) Publicação de chaves - Stallman esclareceu que não é necessária a publicação de chaves privadas, somente daquelas que são necessárias para que o software seja alterado pelo usuário. A intenção não é inviabilizar GnuPG e outras tecnologias deste tipo, e sim de garantir que a pessoa que queira alterar o software tenha todos os componentes necessários para isso.

O painel do qual eu participei, que é sobre divulgação e adoção gerou bastante interação: falamos sobre o caso kernel, sobre como ajudar o processo, como é importante que as idéias sejam todas incluídas no sistema de comentários da FSF, e como a GPL vai continuar sendo um instrumento de proteção da liberdade, não de restrição

Isto tudo, juntamente com reuniões, reuniões e reuniões, foram um pouco do que rolou em Barcelona. Parabéns ao time da FSFE que organizou o evento, e à comunidade, que está usando a metodologia de desenvolvimento de Software Livre para desenvolver a próxima versão de um dos documentos mais importantes da nossa comunidade, a GNU General Public License.

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